Sunday, February 27, 2005

1960-Férias de praia

1960, 10 anos, a Torreira é a praia.
As férias de praia decorrem no mês de Outubro logo após as colheitas do milho e arroz; a festa inicia-se no cais do Esteiro de Salreu, carregando-se no barco mercantel a salgadeira, o pipo de vinho, a saca de batatas, algumas galinhas vivas e outros géneros necessários ao mês de praia, que até aqui foram transportados em carro de bois. Segue-se uma viagem iniciada à sirga pelos canais, e logo depois de passar o "poço do furadouro" a vela é içada. Se o dia é de ria mais agitada, as mulheres refugiam-se numa oração que assusta as crianças. Os homens mostram-se valentes; soube mais tarde que quase todos não sabiam nadar.

Chega-se ao início da tarde, com a alma quente e o coração a saltar de espectactiva.
Normalmente o António Maria dividia a casa com outra família de Salreu, pelo que chegados aquela, era uma azáfama a arrumar todos os pertences, a escolher os quartos de cada família e finalmente a fazer a primeira refeição com água, tirada a balde do poço que existia mesmo em frente à casa dos banhos quentes, e as couves chegadas das Quintas.
A excitação é tanta que custa a adormecer, contribuindo também para isso o cheiro das almofadas e colchões de palha.

Boa noite.

...uma gravata não negra.

Era homem de raça, embora de poucas falas para os amigos dos filhos, não fossem eles habituarem-se à casa; na barra ninguém o batia quando defendia os seus clientes, as mais das vezes as suas clientes, pois o homem tinha fama...
No fim das aulas na escola, o jardim e o quintal eram uma arena de fingidas lutas entre os maus e os bons, lutas essas extinguidas com o buzinar do automóvel atravessado na estrada para que abrissem a porta ao homem de raça. Nessa altura saltava-se o muro ou, se poucos, uma saída discreta pelo portão lateral resolvia a situação.
Eu acho que fui um felizardo ou atrevido pois aos poucos e através da amizade com o SPdas NRS, fui ganhando a sua confiança, tendo acesso a uma biblioteca fantástica que me despertou para o prazer de ler. Devo confessar que lia as "selecções", que porventura não eram o modelo a seguir, com uma avidez impressionante.
Bem, estou a divagar, queria mas era recordar o homem de raça que marcou a minha infância e a quem, na partida, o SP das NRS honrou com uma gravata não negra.
PS - não foram só as "selecções", pois lá, mais tarde, tomei gosto pela Presença e pela Vértice.

Fininho

O António Maria estava mais uma vez frente ao Juiz da Comarca de Estarreja.
Então o senhor António Maria não fez isto assim e tal...
Senhor Doutor Juiz, eu fiz isto assim e assim...
Mas o Senhor António Maria não disse isto assim e assim...
Senhor Doutor Juiz, se o Senhor sabe assim tanto do que eu disse ou fiz, senta-se aqui neste banco que eu vou ouvi-lo para a sua cadeira.

Entradas Frias

Antes de mim o António Maria, filho do avô João. Depois de mim o Miguel e o Pedro. Depois dos depois de mim, o Gustavo, para já...

Rápidas:

  • O avô João estava à porta da tasca da Maria dos Panos, que na altura tinha umas "meninas", quando passo eu e a que iria ser minha mulher. Querendo ser agradável diz: queres entrar, com a tua rapariga, e beber um copo...

  • O Juiz, da Comarca de Estarreja, diz para o António Maria: jura dizer a verdade e só a verdade..."juro senhor Doutor Juiz" responde o António Maria, com os dedos polegar e indicador cruzados atrás das costas.